Limites entre a liberdade de expressão e o dever de urbanidade
O uso crescente das redes sociais trouxe novos desafios para a atuação ética e disciplinar dos servidores públicos. Em um ambiente marcado pela ampla possibilidade de comunicação e exposição de opiniões, torna-se necessário refletir sobre os limites entre a liberdade de expressão — garantida constitucionalmente — e o dever de urbanidade, inerente ao exercício de funções públicas.
A liberdade de expressão e os direitos fundamentais
A liberdade de expressão é um direito fundamental assegurado pelo art. 5º, IV e IX, da Constituição Federal de 1988. Esse direito garante a todos os cidadãos a possibilidade de manifestar suas opiniões, ideias e pensamentos, sem medo de repressão ou censura. Contudo, essa liberdade não é absoluta e encontra limites no princípio da dignidade da pessoa humana, na preservação da honra e na proibição de abusos, como discursos de ódio ou difamação.
Para servidores públicos, essa questão ganha contornos específicos, pois, além de cidadãos, eles representam o Estado e devem observar princípios como legalidade, moralidade e impessoalidade. Essas obrigações exigem que, mesmo em suas manifestações pessoais, eles evitem comportamentos que comprometam a imagem da administração pública.
O dever de urbanidade no serviço público
O dever de urbanidade é uma das obrigações éticas e legais dos servidores públicos, previsto em códigos de ética e estatutos funcionais. Esse dever exige comportamento respeitoso e cortês no trato com colegas, superiores hierárquicos, subordinados e, especialmente, com os cidadãos. Nas redes sociais, manifestações que violem esse dever, como ataques pessoais, ofensas ou críticas desrespeitosas à administração, podem acarretar responsabilização disciplinar.
A responsabilização disciplinar nas redes sociais
Os servidores públicos estão sujeitos à responsabilização disciplinar quando seus atos nas redes sociais:
Jurisprudência e limites interpretativos
O Poder Judiciário tem enfrentado situações envolvendo a conduta de servidores em redes sociais, equilibrando a liberdade de expressão com a ética e disciplina no serviço público. Um exemplo relevante é o julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), que reflete a necessidade contínua de equilíbrio entre a expressão individual e os valores institucionais no setor público.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – COMINATÓRIA C/C TUTELA DE URGÊNCIA – EXCLUSÃO DE COMENTÁRIOS EM REDE SOCIAL – SIMPLES CRÍTICAS – LIBERDADE DE EXPRESSÃO.
A liberdade de expressão só deve ser limitada quando verificados abusos ou excessos por parte dos usuários. Não se verificando que o conteúdo das postagens lançadas em rede social excede o direito constitucional de livre manifestação do pensamento e o direito à crítica, não há motivos para sua retirada. Este entendimento reforça que a liberdade de expressão deve ser preservada, salvo quando configurados abusos que extrapolem os limites do respeito e da urbanidade.
(TJ-MG – AC: 10000204842074001 MG, Relator: Mônica Libânio, Data de Julgamento: 16/09/2020, Data de Publicação: 18/09/2020)
Conclusão
O equilíbrio entre a liberdade de expressão e o dever de urbanidade é essencial para garantir que os servidores públicos exerçam seus direitos constitucionais sem comprometer a imagem e a legitimidade da administração pública. A conscientização sobre o impacto de suas manifestações nas redes sociais, aliada à observância de princípios éticos, é um caminho para evitar conflitos e preservar a integridade do serviço público.
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