Desde segunda-feira (16/10), os serviços de streaming — por exemplo, Netflix e Spotify — passaram a sofrer incidência de ISS na cidade do Rio de Janeiro. Mas essa cobrança levanta dúvidas entre os tributaristas consultados pela ConJur, pois a indefinição sobre a real natureza desses modelos de apresentação de conteúdo online pode tornar a cobrança ilegal.
Evandro Grili, sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes, destaca jurisprudência do Supremo Tribunal Federal impede a incidência de ISS sobre obrigações de dar, pois elas não se caracterizam como fatos geradores do tributo. Ele diz que a contratação de um streaming tem como objetivo obter, mesmo que temporariamente, a cessão dos conteúdos oferecidos.
“E o que o streaming faz é, justamente, a cessão do direito de uso de seu conteúdo às pessoas que pagam para ter esse acesso. Ou seja, típica obrigação de dar, que não cabe no conceito de tributo. Não se trata de um serviço, mas sim da cessão de direitos, de forma temporária, enquanto eu pagar a mensalidade”, afirma.
Para Thiago Sarraf, tributarista do Nelson Wilians e Advogados Associados, apesar de haver jurisprudência no STF sobre essa questão, o assunto é controvertida e ainda há um longo caminho a percorrer até que haja uma pacificação jurisprudencial. Apesar disso, o advogado considera a cobrança legal:
“A tributação é, a rigor, legal, porque tem respaldo na lei complementar 116, que autoriza inclusive a cobrança de serviços provenientes do exterior (importação de serviços)”, afirma, reforçando que é preciso definir se o streaming é um serviço ou não.
“Já que inexiste obrigação de fazer — e sim de dar, colocar à disposição —, aplicando se analogicamente o entendimento da jurisprudência para afastamento do ISS sobre locação de bens móveis”, explica Sarraf.
Lorena Araújo, que também é tributarista do Nelson Wilians e Advogados Associados, defende que não há incidência do ISS sobre streamingjustamente por considerar que a atividade é obrigação de dar: “Pouco se discute acerca da legalidade da aplicação, levando-se em consideração a previsão do artigo 1º da LC 116/2003. A discussão essencial gira em torno da constitucionalidade da nova previsão legal, visto que a instituição do ISS pelos Municípios se dá sobre prestações de serviços consideradas obrigações de fazer, o que não é o caso.”
Atualização da norma
Essa situação envolvendo o streaming, diz Grili, mostra a necessidade de a legislação tributária ser atualizada. Ele afirma que as normas que determinam a incidência de impostos ainda não consideram “todo o complexo cenário de conexões que a internet traz e que permite usufruir do conteúdo dos mais diversos pontos do globo terrestre”.
Para o tributarista a questão a ser respondida é onde, efetivamente, acontece o fato gerador do ISS: “Na cidade onde fica sede da empresa no Brasil? No domicílio da pessoa que adquiriu a assinatura?” “É algo bastante complexo em se tratando de aplicações na internet. Até porque os conteúdos, na sua maioria, vão estar depositados no exterior, o cidadão pode estar em qualquer lugar do mundo para ouvir, bastando estar conectado à internet”, complementa.
Brenno Grillo é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 21 de outubro de 2017
https://www.conjur.com.br/2017-out-21/indefinicao-natureza-streaming-causa-duvida-tributacao
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