O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de seu Plenário Virtual, entendeu, no dia 7 de agosto, que não há repercussão geral a respeito da inclusão, na base de cálculo do ICMS, das tarifas de uso dos sistemas de distribuição ou de transmissão de energia elétrica (TUSD/TUST). Com isso, caberá ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) a definição acerca do tema.
Cabe rememorar que se trata de uma das discussões que mais ensejaram ajuizamento de ações nos últimos tempos e, por meio delas, os contribuintes buscam a redução do valor de suas contas de energia elétrica, redução esta decorrente da retirada das referidas tarifas da base de cálculo do ICMS.
As tarifas, como seus nomes indicam, se destinam a pagar as concessionárias em razão do uso das suas linhas de distribuição e de transmissão de energia elétrica. Os Estados defendem que o imposto deve incidir sobre tais pagamentos, não apenas sobre o montante pago pela energia propriamente dita.
A expectativa é de que o Superior Tribunal de Justiça mantenha seu entendimento tradicional, firmado após anos de debates
Até março deste ano, o Superior Tribunal de Justiça, por intermédio de suas duas turmas que analisam matéria tributária, vinha decidindo de forma favorável aos contribuintes, reconhecendo que as mencionadas tarifas não integram a base de cálculo do ICMS. Entretanto, em 21 de março, a 1ª Turma, por três votos contra dois, decidiu que deve se dar a aludida incidência.
Com isto, ocorreu a quebra da sequência de decisões que também a 1ª Turma vinha proferindo favoravelmente aos contribuintes. Poucas semanas depois, em 20 de abril, a 2ª Turma foi chamada a julgar o mesmo assunto e, ao fazê-lo, manteve, à unanimidade, sua posição tradicional, afastando a incidência do ICMS.
É interessante destacar que a 2ª Turma, em 20 de abril, fez referência ao recente julgamento de março, da 1ª Turma, e comentou que não havia ocorrido alteração no cenário fático nem no contexto normativo relativos ao assunto e, por isso, não via, a 2ª Turma, motivo para modificação da interpretação que, há anos, vinha sendo defendida por ambas as turmas da Corte.
Outro aspecto a ser realçado na decisão da 2ª Turma: foi abordado um artigo do novo Código de Processo Civil (CPC) que determina que a alteração de jurisprudência “observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança”.
Noutras palavras, a 2ª Turma reconheceu (i) que não havia fundamento fático nem jurídico para alteração da jurisprudência e (ii) invocou uma norma que foi trazida pelo novo Código de Processo Civil justamente para contribuir em relação à estabilidade dos entendimentos judiciais.
Tal estabilidade é indispensável para a pacificação das expectativas, que é uma das funções primordiais do direito. Sem a referida pacificação, o demandismo é estimulado, e os contribuintes são prejudicados em seus planejamentos (programação sobre seus custos). Essa falta de previsibilidade também impacta negativamente o Poder Público em suas projeções orçamentárias.
Antes da decisão de março deste ano, da 1ª Turma, os Tribunais de Justiça, em sua maioria, decidiam contrariamente à incidência, pois estavam alinhados ao entendimento histórico do Superior Tribunal de Justiça. Não por acaso, foi incutido nos contribuintes o sentimento de que, à luz da interpretação da Corte Superior, o ICMS não poderia incidir sobre a TUSD e a TUST. Os jurisdicionados receberam, do tribunal superior responsável pela uniformização da interpretação da legislação federal, essa clara sinalização, em reiteradas oportunidades.
Dada essa reiteração das decisões, o Superior Tribunal de Justiça ofereceu uma verdadeira orientação a todos os interessados no assunto. Decerto, a douta Corte levará esse histórico em consideração quando da definição da tese, provavelmente pela sua 1ª Seção, que reúne os ministros da 1ª e da 2ª Turmas.
Quanto ao mérito da discussão, será decidido se o ICMS, no contexto da energia elétrica, pode incidir sobre outras rubricas que não a energia em si, pelo simples fato de essas rubricas orbitarem em torno da energia. É indiscutível que as referidas tarifas não se confundem com a energia elétrica e, por isso, a expectativa é de que o Superior Tribunal de Justiça mantenha seu entendimento tradicional, firmado após anos de amadurecimento do debate.
Do contrário, ou seja, caso se afirme ser possível incidir o ICMS sobre a TUSD e a TUST, nada impedirá que, no futuro, qualquer outro valor seja inserido na base de cálculo do ICMS apenas pelo fato de ter alguma relação com a energia, mesmo que com ela não se confunda. Isto significaria um alargamento da base de cálculo sem alteração normativa que o justificasse.
Há, portanto, uma excelente oportunidade para que o Superior Tribunal de Justiça prestigie os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, tão caros para a estabilidade do sistema jurídico, e reafirme a orientação que, durante anos, ofereceu aos jurisdicionados.
Fonte : Valor -06-09-2017
Caso o Estado apreenda de forma indevida um carro, deve pagar o IPVA do tempo que ficou com o veículo e por eventuais danos ao veículo. Com esse entendimento, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região confirmou sentença que condenou a União a pagar a um empresário de Medianeira (PR) o IPVA e R$ 13 mil por dano material por ter apreendido equivocadamente seu veículo.
O carro foi apreendido em maio de 2007 por policiais federais que investigavam pessoas na denominada operação campo verde. Segundo os policiais, o veiculo seria produto de crime e moeda de troca de negociações envolvendo agrotóxicos.
Na 3ª Vara Federal de Foz de Iguaçu (PR), o proprietário conseguiu comprovar que o veiculo era de sua legítima propriedade e havia sido adquirido por fontes financeiras licitas. Após sete anos da apreensão, conseguiu seu veiculo de volta.
O proprietário alegou que o automóvel não foi devolvido no estado que foi apreendido. Ele então ajuizou ação solicitando a condenação da União ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, bem como do IPVA, pelos sete anos que ficou sob o poder da autarquia federal.
A 2ª Vara Federal de Foz do Iguaçu julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a União a pagar o valor de aproximadamente R$ 13 mil pelo conserto do veiculo e pelo IPVA de 2008 a 2014.
A União recorreu ao tribunal alegando que foi correta a apreensão do veículo para apuração, já que necessária para investigação da ‘operação campo verde’. Portanto, que seria indevida indenização, eis que a apreensão foi medida utilizada no âmbito do poder de polícia outorgado à Administração Pública.
O relator do caso no TRF-4, desembargador federal Cândido Alfredo Silva Leal Junior, manteve o entendimento de primeira instância. “Embora a apreensão do veículo tenha decorrido do poder de polícia outorgado à administração pública, o bem deveria ter sido devolvido no estado em que foi apreendido, apenas com a desvalorização normal pelo tempo decorrido. Todavia, no caso dos autos, o veículo ficou mais de sete anos exposto às intempéries e, quando devolvido, estava em condições precárias”, afirmou. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-4.
Fonte: Consultor Jurídico
O Conselho Federal da OAB ajuizou ação civil pública contra o aumento das alíquotas de PIS e Cofins de combustíveis. Segundo a inicial, protocolada na sexta-feira (25/8) na Justiça Federal em Brasília, o decreto que elevou os tributos é inconstitucional por violar o princípio da legalidade.
De acordo com a entidade, o inciso I do artigo 150 da Constituição Federal proíbe ao Executivo, federal, estadual ou municipal, de “exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”. E ao fazê-lo por meio de decreto, a União usurpou a competência do Legislativo. A norma assinada pelo presidente Michel Temer em julho deste ano, de acordo com a OAB, afrontou também o princípio constitucional da anterioridade nonagesimal, segundo o qual se exige que a lei que institua ou majore tributo aguarde 90 dias para começar a ser cobrado.
“Não é possível que o Governo Federal tente suplantar suas enormes dificuldades de gestão, muitas delas decorrentes de uma péssima administração, corrupção galopante/insolúvel e escolhas fisiologistas, com o sacrifício dos consumidores”, diz a petição, assinada pelo presidente da OAB, Claudio Lamachia, e pelo procurador procurador especial tributário da entidade, Luiz Gustavo Bichara. “O fundamento principal da ação é o princípio da legalidade tributária, garantia constitucionalmente assegurada aos contribuintes. É evidente que o comando constitucional sobre a reserva absoluta de lei formal para criação ou majoração de tributos não foi observado, tampouco a anterioridade nonagesimal”, disse Bichara à ConJur.
A medida já foi suspensa e permitida de novo três vezes pelo Judiciário. No dia 24 de agosto, a Justiça Federal no Rio Grande do Sul vetou o aumento, mas os efeitos da decisão são limitados ao estado. O decreto já foi questionado no Supremo Tribunal Federal. A ministra Rosa Weber relata a ação.
Na ação, a Ordem aplica a tese do Estatuto dos Contribuintes, de Humberto Ávila, segundo a qual os direitos fundamentais dos cidadãos frente à arrecadação tributária constituem um conjunto de garantias que não podem ser violadas. Esses direitos, portanto, só podem ser relativizados nas situações expressamente previstas na Constituição, como aumento das alíquotas de IOF, IPI, Imposto de Importação e da Cide-Combustíveis, conforme diz o artigo 153, parágrafo 1º.
A entidade critica ainda o aumento da carga tributária sobre os combustíveis por provocar efeito cascata na economia, majorando os preços dos alimentos e insumos. “As consequências são drásticas para um país que urgentemente precisa de investimentos produtivos”.
A defesa do governo é que o decreto que aumentou as alíquotas, de julho deste ano, derrubou outros, de 2004 e 2008, que reduzia as alíquotas de PIS e Cofins sobre combustíveis. Mas a Justiça Federal tem concordado com as teses agora defendidas pela OAB, embora os presidentes dos tribunais federais tenham atendido aos pedidos da União. Os presidentes dos tribunais federais da 1ª, 2ª e 5ª regiões cassaram as liminares que suspenderam os aumentos.
Fonte: Consultor Jurídico
RE 574.706 abriu margem para exclusão do ICMS da base do IRPJ e CSLL.
Uma nova abordagem sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo de tributos como do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) ganhou força após a decisão da Suprema Corte, em março, que entendeu não incidir ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins (RE 574.706).
A possibilidade da exclusão pode impactar grande parte das empresas brasileiras, visto que as companhias de médio e pequeno porte – com faturamento entre cinco e dez milhões de reais – costumam recolher o IRPJ e a CSLL com base no lucro presumido.
Atualmente existem dois processos nos tribunais superiores que aguardam julgamento da matéria – o RE 913.014 no STF e o REsp 1.627.618/RS no STJ. Nos tribunais federais, porém, a tendência tem sido de vitória do contribuinte.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), por exemplo, tem entendido que o ICMS não integra a base de cálculo de IRPJ e CSLL. A tese não é nova, mas os desembargadores começaram a aceita-la após a decisão do Supremo, no RE 574.706. São pelo menos oito decisōes favoráveis ao contribuinte do tribunal com jurisdição no sul do país.
A decisão mais recente sobre esse caso foi proferida no início de agosto, no MS 5011192-28.2017.4.04.7200/SC. O juiz federal Gustavo Dias de Barcellos citou em seu voto as decisōes do Supremo no RE 240.785 e RE 574.706. Nestes casos, a Corte definiu que o valor arrecadado a título de ICMS não reflete riqueza obtida, pois constitui ônus fiscal e não faturamento da empresa. Além disso, o tributo não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, não podendo integrar a base de cálculo do PIS/Cofins.
Para o magistrado, o entendimento também se aplica ao IRPJ e à CSLL que, no regime de lucro presumido, incidem sobre a receita bruta das empresas. Desse modo, se o ICMS não pode ser incluído para fins do cálculo do PIS e da Cofins, também não pode para a determinação do lucro presumido.
“Não integrando o ICMS a base de cálculo da contribuição para o PIS e a Cofins, não tem aplicação, ao caso, a nova redação dada ao art. 3º da Lei n. 9.718/98, bem como ao art. 1º, §§ 1º e 2º, das leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, que determina o faturamento que compreende a receita bruta de que trata o artigo 12 do Decreto-Lei n. 1.598/77 – como base de cálculo de tais contribuições”, afirmou Barcellos.
A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) deve recorrer da sentença. Embora o juiz tenha demonstrado dois julgados do TRF4 acerca do tema, a Procuradoria entende que a questão ainda não está consolidada, visto que não há decisão de tribunal superior sobre a discussão.
A advogada do caso Amal Ibrahim Nasrallah, sócia do escritório Nasrallah Advocacia, comemorou a decisão e disse que, pelo entendimento do Supremo, o valor do ICMS não compõe a receita bruta porque não se incorpora ao patrimônio do contribuinte – representa apenas ingresso de caixa ou trânsito contábil a ser totalmente repassado ao fisco estadual.
“Sendo assim, os valores recolhidos a título de ICMS não compõem a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, que nada mais é do que um percentual sobre a receita bruta”, conclui.
O advogado Carlos Navarro, sócio do escritório Viseu Advogados, considerou a decisão extremamente relevante do ponto de vista jurídico e financeiro das empresas. “É uma tese nova que surge na rabeira da ICMS na base de PIS e Cofins”, diz.
Para o advogado, o juiz usou o julgado do Supremo de forma inteligente, pois pegou as razões de decidir do caso do STF e adaptou a outros tributos, que possuem o mesmo conceito de receita para a base de cálculo. “Não é possível que haja vários conceitos diferentes de receitas. Assim como o STF já sinalizou que para contribuição de receita bruta pode excluir o ICMS, faz sentido também excluir o presumido”, opina.
As decisão já afetou o escritório Barbero Advogados. O advogado Reinaldo Zangelmi, sócio da banca, conta que começou a desenvolver novos trabalhos com clientes para reduzir ou fazer uma economia na questão da tributação, agora que é possível excluir a diferença do ICMS na base de cálculo. Os casos não costumam envolver um valor alto, visto que são empresas de grande porte que utilizam do lucro presumido, mas podem gerar economia ao pequeno e médio empreendedor.
Relação entre os tributos
A decisão do Supremo deixou claro que o ICMS é mero ingresso na contabilidade da pessoa jurídica, por ser, na verdade, uma receita dos Estados. No caso do PIS/Cofins, a base de cálculo é o faturamento da pessoa jurídica. Isso significa que o ICMS pode ser deduzido pois, no momento em que se fatura sobre a venda de uma mercadoria, uma parte dela tem a destinação definida para o Estado em forma de tributo.
Uma mercadoria, por exemplo, que custa R$ 100 reais e o contribuinte tem que pagar R$ 18 reais de ICMS. A Receita Federal entende que o valor da receita bruta são os R$ 100 da mercadoria. O que STF decidiu é que o valor do ICMS – RS 18 reais – não integra essa receita para fins de incidência do PIS/Cofins, devendo a base de cálculo ser reduzida para R$ 82 – diferença entre o preço da mercadoria e o valor pago pelo tributo. No caso da IRPJ e da CSLL a base de cálculo é o lucro presumido, que decorre da aplicação de um percentual sobre a receita bruta.
“É uma solução meio salomônica, embora não prevista em lei”, afirmou Fábio Alexandre Lunardini, tributarista do Peixoto & Cury Advogados. Para o advogado, os tribunais aguardam a modulação dos efeitos da decisão da Corte Superior. “Ela representou um verdadeiro arquétipo em favor das empresas que tributam no lucro real. Agora, a decisão [do STF] torna a discussão atraente também para as empresas do lucro presumido”, concluiu.
O especialista em Direito Tributário do Braga Nascimento e Zilio Advogados, Renato Marcon, afirma que as decisões que equiparam o julgamento do STF com o IRPJ e CSLL podem ser precipitadas, pois existem diferenças relevantes entre os temas.
“No julgamento do STF parte-se de uma análise do conceito constitucional de receita. Esse conceito foi apreciado para servir como base de cálculo do PIS e da Cofins, agora esse caso analisado é diferente. Esse conceito de receita bruta que serve como referência no percentual presumido de lucratividade vem de legislação infraconstitucional”, explicou o advogado, enfatizando que no caso do IRPJ e da CSLL a receita bruta não é a base de cálculo dos tributos, e sim referência do percentual presumido de lucratividade.
Para a União, os percentuais de lucro presumido já representam dedução e o ICMS está incluso nelas. Além disso, os percentuais previstos pelo legislador consideram todas as despesas, inclusive sobre os produtos incidentes na venda. Isso porque o lucro presumido é uma opção do contribuinte, que normalmente escolhe por essa modalidade quando a margem de lucro é maior do que a presumida.
O principal argumento contra a não incidência do ICMS no regime de lucro presumido é que não poderia o contribuinte querer o benefício do presumido e, ao mesmo tempo, querer os benefícios do lucro real, porque é neste que se pode aferir a despesa do ICMS.
Para Nasrallah, se o ICMS não integra a receita bruta, não se pode falar que o ICMS estaria dentro das deduções previstas na lei, visto que ele não integra a receita bruta para que possa ser deduzido. Tampouco o ICMS é despesa da pessoa jurídica porque, conforme destacou o STF, o valor do imposto é mero ingresso na contabilidade da pessoa jurídica, pois é receita dos Estados.
“Por outro lado, o percentual de dedução do lucro presumido não considera as despesas do contribuinte, como quer fazer a União Federal. O contribuinte que opta pelo lucro presumido paga IRPJ e CSLL mesmo se tiver prejuízo. De fato, quando o contribuinte faz a opção no início do ano pelo lucro presumido, na verdade não sabe se terá lucro ou prejuízo durante o ano, é uma loteria. Se tiver prejuízo irá pagar o IRPJ e a CSLL da mesma forma”, concluiu a advogada.
Giovanna Ghersel – Brasília
Fonte: Jota Info
Imagine-se um motorista de um imponente caminhão que pega uma grande e movimentada rodovia e começa a dirigir na contramão. Indagado por sua conduta, responde sorridente: estou dirigindo como os ingleses! Pode ser que alguns juízes brasileiros, sem se darem conta, pensem que estão decidindo como seus pares na Inglaterra. Isso não é verdade, ainda que uma grande mudança na formação da decisão judicial esteja acontecendo entre nós.
A Constituição Federal determina que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, bem como estipula que os tributos só podem ser criados ou modificados por lei. Todavia, em matéria tributária, os juízes têm, cada vez com maior frequência, decidido de forma diferente do que a sociedade encontra na legislação, criando até mesmo obrigações tributárias não aprovadas pelo Congresso.
Os exemplos se avolumam: responsabilidade tributária não prevista em lei, suspensão da prescrição sem completa base legal, incidência dupla do IPI Importação. Os juízes estão passando a ser a nova fonte do direito tributário, suplantando a Constituição e o Legislativo.
Os juízes aqui podem estar tentando melhorar a arrecadação, reduzir a sonegação ou simplesmente refletindo seus desejos pessoais
Por que agem assim? Como os magistrados só decidem se provocados, e quem não concorda pode recorrer, na verdade eles estão sendo atraídos a tomar novos caminhos pelos advogados do Fisco. Estes não estão buscando o Congresso e pedindo mudanças nas leis tributárias, ou à Presidência da República e conseguindo alterações via medida provisória. Eles estão buscando os gabinetes de tribunais, principalmente nas Cortes superiores, e conseguindo decisões que lhes sejam mais favoráveis, ainda que contrariem as leis, com muito mais facilidade.
Isso porque existem três possibilidades de mudança nas regras tributárias que atingem todo o país: pelo Congresso, pelo presidente da República e pelos juízes. Ainda que haja imperfeições em todas essas vias, a mais democrática é a legislativa, cujos trâmites podem ser acompanhados por todos, principalmente pela mídia, em diversas fases.
Assim, as mudanças da legislação, feitas desde a origem no Congresso, começam com a proposta apresentada por algum parlamentar, tramitam por comissões legislativas e precisam ser aprovadas em plenário. Quando o assunto em discussão é uma lei nacional, seu quórum é mais difícil de ser alcançado, como as mudanças que atingem o Código Tributário Nacional (CTN). Os projetos de lei podem ser acompanhados pela sociedade em todas essas etapas, não sendo raro que tais discussões passem a ser públicas e publicadas pela mídia.
As mudanças por medidas provisórias nascem nos gabinetes palacianos e, aprovadas pelo presidente, passam a valer desde a publicação, mas têm que ser aprovadas pelos parlamentares, inclusive nas comissões já mencionadas. Aqui não há controle social prévio, mas há depois, durante os trâmites da MP no Congresso. Já as mudanças legais via Poder Judiciário não são nada republicanas e nem transparentes. Não estão sujeitas aos trâmites dentro do Executivo e nem do Legislativo, não se submetendo ao crivo da Mídia ou da população em nenhuma de suas etapas, pois elas nascem de petições dos advogados e terminam com a decisão dos juízes.
Para exemplificar, com o Recurso Extraordinário n. 1.120.295/SP o egrégio Superior Tribunal de Justiça pôs abaixo o artigo 174 do CTN, que trata da prescrição do crédito tributário, mediante o voto de oito ministros. A mesma mudança, via Congresso, demandaria a aprovação da maioria absoluta dos parlamentares, ou seja, ao menos 257 deputados e 41 senadores! As mudanças das regras tributárias pelo Judiciário, assim, ficam mais fáceis e mais silenciosas do que as demais.
Com as alterações no direito feitas por juízes, aproximamo-nos do common law? Na verdade, não. Na Inglaterra, as sentenças são baseadas nos princípios gerais de direito e os julgadores aplicam os precedentes que foram sendo construídos nos últimos séculos, em um modelo aceito desde sempre pelos parlamentares. A regra é o juiz aplicar a decisão dos que o antecederam, conferindo segurança jurídica aos jurisdicionados. E quando as sentenças do passado não refletem mais o desejo da sociedade ou mesmo do Poder Judiciário? Eles entendem que cabe ao Parlamento estabelecer o novo direito. Em matéria tributária, a decisão cabe ao Legislativo desde a Magna Carta (“não tributação sem representação”), repetida na Constituição dos EUA. Então, nem na Inglaterra os magistrados estão autorizados a criar regras tributárias. No Brasil é igual, com o princípio da legalidade.
Os juízes aqui podem estar tentando melhorar a arrecadação, reduzir a sonegação, facilitar para o Fisco ou simplesmente refletindo seus desejos pessoais. Não percebem que suas decisões aumentam a insegurança jurídica, levam à redução da atividade econômica, afugentam investidores estrangeiros e ampliam a desconfiança da sociedade no Judiciário.
Desejamos que nossos pares voltem a depositar no Legislativo a autoridade para estabelecer as regras tributárias, permitindo o aumento da confiança nos juízes e no direito, ainda que contrariem os interesses dos procuradores fazendários. Afinal, juízes não são eleitos e na nossa ordem constitucional vige o princípio da legalidade, não o da jurisprudencialidade.
Renato Lopes Becho é professor de direito tributário na graduação, especialização, mestrado e doutorado da PUC-SP, livre-docente pela USP, pesquisador visitante no King’s College, Londres. Juiz federal e coordenador do Fórum de Execuções Fiscais de São Paulo/SP
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Por Renato Lopes Becho
Fonte : Valor
A Receita Federal vai continuar a exigir a inclusão dos valores relativos ao adicional de um terço de férias e aos primeiros 15 dias de afastamento de empregado – em razão de doença ou acidente – no cálculo de contribuições previdenciárias. Por meio da Solução de Consulta nº 99.101, publicada ontem no Diário Oficial da União, o órgão orientou os fiscais a não levarem em consideração o julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra a cobrança.
Em recurso repetitivo, os ministros entenderam que, por não terem natureza remuneratória, essas verbas não integram o salário de contribuição. O órgão determina ainda que os fiscais ignorem a Nota nº 115, de 2017, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que dispensava os procuradores de recorrer em relação à contribuição devida pelo empregado.
A única parte da solução de consulta favorável aos contribuintes é a que confirma que o aviso prévio indenizado, exceto seu reflexo no 13º salário, não integra a base de cálculo das contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de salários.
De acordo com o advogado Alessandro Mendes Cardoso, do Rolim, Viotti & Leite Campos, os juízes de primeira instância estão aplicando o repetitivo do STJ. Segundo a decisão dos ministros, não têm natureza remuneratória e, portanto, não entram no cálculo da contribuição ao INSS: o terço de férias, o salário-maternidade, o salário paternidade, o aviso prévio indenizado e os 15 dias de afastamento.
Contudo, recente julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), com repercussão geral, fixou a tese de que “verbas habituais” compõem o cálculo da contribuição previdenciária. Assim, a PGFN editou uma nova nota, a nº 520, considerando esse julgamento. E na solução de consulta a Receita Federal leva em consideração essa nova nota.
“Como a decisão do STF ainda não foi publicada e a Corte não estabeleceu nela um conceito de habitualidade, restou uma grande insegurança jurídica”, afirma Cardoso. Segundo o advogado, pela Nota 520, a PGFN tem defendido nos processos que o entendimento do STJ foi superado pela decisão do STF. “Com a solução de consulta, os fiscais do país passam a adotar o mesmo entendimento da PGFN”, diz.
O tributarista afirma que grande parte das empresas tem decisão judicial que afasta a incidência da contribuição previdenciária sobre o terço de férias e o afastamento por 15 dias. “Quem tem decisão favorável deve continuar a se basear nela, mas sabendo que ela pode cair, conforme a decisão do STF. Não há mais segurança de que a decisão do STJ, ainda que em recurso repetitivo, seja definitiva”, afirma Cardoso.
Para a tributarista Gabriela Miziara Jajah, do escritório Siqueira Castro Advogados, ainda que possa parecer um tanto absurdo, o contribuinte só deverá deixar de recolher a contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias e primeiros 15 dias de afastamento do empregado em razão de doença ou acidente se tiver autorização judicial. “A solução gera um ambiente de extrema insegurança aos contribuintes”, afirma.
Fonte: Valor
O Ministério Público Federal em Macaé (RJ) manifestou-se a favor do pedido da ação popular movida pelo advogado Décio Machado Borba Netto para suspender o aumento das alíquotas de PIS e Cofins sobre combustíveis, instituído pelo Decreto 9.101/2017.
No início de agosto, a Vara Federal Única de Macaé concedeu liminar favorável ao pedido da ação. Segundo entendimento do juiz, o aumento das alíquotas atenta contra o princípio da legalidade tributária e da anterioridade nonagesimal, segundo o qual se exige que a lei que institua ou majore tributo aguarde 90 dias para começar a ser cobrado. No entanto, a liminar foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ e ES).
Na manifestação, o procurador da República Leandro Mitidieri considera que o aumento afronta a Constituição porque foi feito por meio de decreto, e não de lei. Além disso, ele também avalia que as novas alíquotas só poderiam entrar em vigor 90 dias após a publicação da norma.
De acordo com o procurador, a primeira instância é competente para julgar ação popular contra ato do presidente da República. Citando as teses da profunda democratização (deep democratization) e das instituições “inclusivas”, e sua relação com a realidade de corrupção do país, Mitidieri ressalta que, “ao se interpretarem todas as questões jurídicas contidas na presente demanda, relativas à virilidade da ação popular em nosso sistema, há que se ter em mente que isso afeta fundamentalmente o incentivo ou desincentivo da tão fraca participação popular no Brasil”.
Além da ação em Macaé e de outras na primeira instância, uma ação direta de inconstitucionalidade questiona o Decreto 9.101/2017 no Supremo Tribunal Federal. Com informações da Assessoria de Imprensa do MPF-RJ.
Fonte: Consultor Jurídico
As microempresas (ME) e as empresas de pequeno porte (EPP) podem fazer a opção pelo regime tributário especial denominado Simples Nacional que, sem dúvida, traz vantagens econômicas e tributárias, proporcionando que o recolhimento de oito tributos (IRPJ, CSLL, PIS/Pasep, Cofins, IPI, ICMS, ISS e a Contribuição para a Seguridade Social destinada à Previdência Social a cargo da pessoa jurídica) ocorra mediante a expedição do documento único de arrecadação (DAS)[1].
Podem ser consideradas ME e EPP, a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o artigo 966 do Código Civil, devidamente registradas no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, sendo que, para tanto, as ME poderão auferir, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000 e as EPP receita bruta superior a R$ 360.000 e igual ou inferior a R$ 4.800.000.
Todas as ME e EPP que possuírem débitos tributários para com algum dos entes federativos – União, estados, Distrito Federal e municípios -, deverão regularizá-los sob pena de exclusão do regime tributário Simples Nacional, previsão disposta nos artigo 17, V, da Lei Complementar 123/2006 e no artigo 6º, parágrafo 2º, I, da Resolução CGSN 94/2011.
Tal procedimento de exclusão pode ser considerado completamente ilegal e inconstitucional, se for resultado – exclusivamente – de dívidas tributárias, por constituir-se em expediente sancionatório indireto para o cumprimento da obrigação tributária.
Cabe ressaltar o entendimento do Tribunal Regional Federal da 1ª Região quando refere-se a coação indireta, afirmando ser a jurisprudência uníssona para afastar a sanção que obrigue as pessoas a saldarem débitos pendentes, prescrevendo que “não pode, em razão da existência de débito, recusar a prestação de seus serviços, uma vez que o ordenamento jurídico confere ao credor meios legais próprios para cobrança de seus créditos, sendo desarrazoada, portanto, a utilização de sanções administrativas como meio coercitivo para compelir o administrado ao pagamento de seu débito”[2].
No mesmo sentido é a decisão do Supremo Tribunal Federal analisando os prejuízos sofridos pelas empresas ao serem excluídas do regime tributário Simples Nacional, proclamando que “nesse regime, em que há, entre outras vantagens, tratamento diferenciado e favorecido quanto ao recolhimento de tributos e ao cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias, as micro e pequenas empresas têm a possibilidade de sofrerem uma menor tributação, o que impacta, lógica e diretamente, no seu caixa. Os impactos econômicos, financeiros e jurídicos decorrentes da exclusão da impetrante de regime de tributação que é mais favorável ao exercício de suas atividades são aptos à caracterização do dano de difícil reparação previsto no artigo 527 do CPC/1973”.[3]
A exclusão do regime tributário Simples Nacional, somente por dívida tributária, é indiscutível e puramente sanção política, implicando em negativa de direito ao exercício da atividade econômica empresarial. Agindo assim, a Fazenda está fazendo “justiça pelas próprias mãos […] levando a empresa ao caos”[4], restando “inconstitucionais as restrições impostas em razão do não pagamento de tributo”[5]. Somente no ano de 2016, foram excluídas do regime tributário Simples nacional, de ofício – por débitos tributários – um total de 375.160[6] empresas e nos primeiros meses de 2017, já foram excluídas 7.839[7] empresas.
Se o Fisco pretende haver seus créditos contra os contribuintes, pode e deve lançar mão de meios mais adequados para essa finalidade, conforme previsões dispostas nas legislações pátrias.
A Lei Complementar 123/2006 não foi criada para resolver os problemas financeiros e do fluxo de caixa das empresas e das Fazendas Públicas federais, estaduais ou municipais, mas sim para regulamentar o que estava disposto na Constituição Federal nos artigos 146, ‘d’, parágrafo único, e 170, IX e parágrafo único, por isso que desimporta os valores negativos – se expressivos ou não – nos caixas públicos, o Estado existe para fazer cumprir seu papel, decorrente de lei constitucional e ponto, nada, além disso, deve ser inventado para ludibriá-la.
As Fazendas Públicas já possuem instrumentos de cobrança ágeis e eficazes das dívidas tributárias, dentre os quais se destacam: a Lei de Execuções Fiscais 6.830/1980, a negativação no cadastro do empreendedor (Cadin, Serasa), entre outros inúmeros recursos menos gravosos, cujas sanções, sem dúvida, poderiam substituir o ato de exclusão do contribuinte do Simples Nacional, por dívida tributária. É que, segundo as disposições constantes do artigo 805 do CPC/15, que no caso do processo judicial, aqui usado por analogia, o juiz determinará a execução de modo menos gravoso ao devedor.
Assim: o devedor, que não tem condições, momentâneas, de cumprir com o pagamento dos compromissos tributários – em dia -, deverá ser onerado com a carga tributária mais elevada – em decorrência da sua exclusão do Simples Nacional? Frisa-se: isso poderá resultar no encerramento de suas atividades, o que certamente não é o objetivo do legislador constitucional.
Cabe ressaltar que a vedação aos excessos praticados pela Fazenda Pública no ato da exigibilidade dos débitos tributários, encontra respaldo nos princípios constitucionais da proporcionalidade e do livre exercício da atividade econômica (artigo 170, parágrafo único, da Constituição Federal), caracterizado, pela adequação e razoabilidade dos atos administrativos, sempre no intuito de atingir a finalidade. Assim sendo, o ato de exclusão do Simples Nacional por dívida tributária (artigo 17, V, da Lei Complementar 123/2006), sem dúvida, materializa ilegalidades e inconstitucionalidades, valendo, ainda, ressaltar que o princípio do exclusivismo exprime o contido nos artigo 110 do CTN, ao afirmar que não se pode exigir nenhum elemento adicional ao descrito na Constituição Federal.
Perfeitamente aplicável a manifestação do Supremo Tribunal Federal no sentido de que “com efeito, tenho que não é cabível a imposição de sanções administrativas indiretas como forma coativa de cobrança de tributos, enquanto não esgotadas as vias ordinárias das quais deve se valer o Fisco para a obtenção do seu crédito. Nesse sentido, editou o Supremo Tribunal Federal as Súmulas 70, 323 e 547, com o objetivo de impedir que a autoridade administrativa, a pretexto de obrigar o contribuinte a cumprir suas obrigações tributárias, inviabilize a atividade por ele desenvolvida, em obediência ao princípio constitucional do livre exercício da atividade econômica. (Nesse sentido: RE 106.759/SP, relator ministro Oscar Corrêa, DJU 18.10.1985).
Invoca-se, ainda, a função social da empresa no intuito de proteger as relações e as atividades econômicas (emprego e renda), já que a Lei Complementar 123/2006 – e suas atualizações – sempre primou pela obediência aos preceitos transindividuais, quais sejam, os direitos humanos.
Ora, se a dignidade da pessoa humana é reconhecida enquanto princípio constitucional, ela é inafastável de qualquer relação e deve fundamentar, inclusive, a ordem econômica.
A dignidade do trabalhador, através da proteção contra o desemprego, está, sem dúvida, no escopo da evolução dos direitos do homem, desde o final da Segunda Guerra Mundial, razão pela qual ao se examinar instrumentos clássicos de direitos humanos encontram-se várias referências à dignidade do trabalhador, como direito fundamental do ser humano. “O fundamento da República não é constituído apenas pela livre iniciativa e pela valorização do trabalho, mas também, e especialmente, pela repercussão social de ambas as figuras. Impossível, portanto, não associar a ‘valores sociais’ a noção de ‘função social’ da maior relevância para a Constituição de 1988”[8].
A Constituição Federal no artigo 1º prescreve que os fundamentos do País são a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. Em seguida, no artigo 3º, afirma ser indispensável a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza, da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Efetivando-se, assim, o exercício dos direitos sociais, referente à função social da Empresa e o valor social do trabalho, previstos nos artigos 6º e 7º da Constituição Federal.
Os estudiosos[9] explicitam um extensivo rol de dispositivos constitucionais de relevante influência aos artigos 6º e 7º da Constituição Federal, no entanto, com o merecido destaque, reporta-se à Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, ao prever que “todo homem tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego”[10].
O desempenho social da empresa tem “função macroeconômica”, pois quando se defende o enraizamento da questão das empresas adeptas ao regime tributário simplificado, constata-se que sua função não se limita a “unicamente em pagar tributos”, como tenta fazer crer a Fazenda Pública – órgão do governo instituído unicamente com a finalidade arrecadatória -, mas também, “especialmente na manutenção da oferta de trabalho ao maior número possível de pessoas”[11].
Portanto, corolário é a função social da empresa e do trabalho, nos termos expostos, pois obedecem, além dos princípios constitucionalmente protegidos, preceitos de direitos humanos ao albergar a atividade econômica enquanto direito indispensável, afastando, assim, todos os reflexos arrecadatórios impostos pelo Governo de forma coercitiva.
Por tais razões, o procedimento de exclusão das empresas do regime tributário especial denominado Simples Nacional pode ser considerado completamente ilegal e inconstitucional, se for resultado – exclusivamente – de dívidas tributárias.
Por Cláudio Tessari e Camila Bandel
[1] Disponível em. Acesso em 07/02/2017.
[2] AMS 0009162-47.2007.4.01.3900/PA, Relator Desembargador Federal Néviton Guedes, Relatora Conv. Juíza Federal Daniele Maranhão Costa (Conv.), 5ª T. TRF1, e-DJF1 de 16/06/2016.
[3] RMS 49921/RS, STJ, 1ª T., Relator Ministro Gurgel De Faria, julgado em 03/05/2016, DJe 19/05/2016.
[4] RE 413782-8/SC, STF, Pleno, Relator Ministro Marco Aurélio, j. 17/03/2005, DJU 03/06/2005.
[5] MACHADO, Hugo de Brito. Teoria geral do direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 368.
[6] Disponível em. Acesso em 09/02/2017.
[7] Disponível em. Acesso em 09/02/2017.
[8] CANOTILHO, J.J. Gomes [et al.]. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 134.
[9] CANOTILHO, J.J. Gomes [et al.]. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 536-537.
[10] Disponível em. Acesso em 10/02/2017.
[11] BARBOSA, Joaquim. Parecer jurídico. Disponível em. Acesso em 09/02/2017.
Fonte: Conjur – Consultor Jurídico
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi provocado a julgar, em recurso repetitivo, a polêmica sobre a inclusão da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) na base de cálculo do ICMS.
A ministra Regina Helena Costa é quem deve pautar a proposta de afetação, que será decidida pelos ministros das turmas de direito público do tribunal.
Caso a ministra entenda que os pré-requisitos para julgar o processo estão presentes, a 1ª Seção do tribunal pode analisar se afeta o caso como repetitivo. Neste caso, o entendimento dos ministros se tornará orientação para os juízes que analisarem discussōes idênticas.
O litígio impacta as empresas que negociam energia elétrica no mercado livre e os Estados, que calculam perdas bilionárias na arrecadação. A TUSD e a TUST integram o preço praticado nos contratos negociados no mercado livre.
A matéria é controvertida nas duas turmas do STJ. A discussão começou quando a 1ª Turma mudou o seu entendimento sobre o assunto e decidiu que o ICMS incide sobre a Tusd. O voto vencedor foi do relator do caso, ministro Gurgel de Faria, para quem, apesar das recentes mudanças no sistema de regulamentação do setor elétrico brasileiro, não é possível permitir tratamento diferenciado entre consumidores do mesmo bem (cativos e livres). Os ministros Regina Helena Costa e Napoleão Nunes Maia Filho ficaram vencidos na ocasião.
Logo em seguida, a 2ª Turma teve um entendimento divergente e reforçou a tese de que ICMS não incide sobre a Tusd. A decisão foi unânime.
O STJ foi provocado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo a resolver o litígio por meio de recurso repetitivo. De acordo com o tribunal, nos últimos três anos foram proferidas aproximadamente 17 mil sentenças e quase 5 mil acórdãos relacionados ao assunto.
A procuradoria fiscal do Estado de SP afirma que, em maio, haviam mais de 57 mil processos sobre o assunto. “O tema foi judicializado de forma discreta ao longo do ano de 2015 e até a metade de 2016, tendo havido estratosférico aumento da demanda ao longo do último semestre de 2016, verificando-se um incremento da ordem média de 2.000 processos por mês, correspondendo a 800% de incremento nos últimos cinco meses do ano passado”, narra a procuradoria.
Um segundo processo também deve ser distribuído para a ministra Regina Helena Costa. Pelo regimento interno do STJ, o tribunal de origem seleciona dois ou três recursos representativos e susta a tramitação dos demais, o que amplia a possibilidade de o STJ afetar o tema como repetitivo.
STF
Recentemente, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal entendeu que a controvérsia é infraconstitucional e negou reconhecer a repercussão geral do caso.
Apenas o ministro Marco Aurélio votou pela constitucionalidade da discussão sobre a inclusão dos valores pagos a título de TUST e TUSD.
Em seu voto no plenário virtual, Marco Aurélio afirmou que se prevalecer o entendimento de Fachin, ele irá submeter outro caso sobre a mesma matéria ao plenário virtual, como uma segunda chance para que a repercussão do tema seja reconhecida.
Leia o despacho de distribuição do recurso.
https://jota.info/tributario/stj-pode-julgar-icms-sobre-tusd-como-repetitivo-17082017
O limite de 30% ao ano para abatimento de prejuízo fiscal de impostos não se aplica a empresas que já encerraram suas atividades. Foi o que decidiu na quarta-feira (16/8) o juiz Tiago Bitencourt de David, substituto da 5ª Vara Federal Cível de São Paulo. Para o magistrado, o abatimento do prejuízo fiscal é um direito dos contribuintes, e não uma concessão da Fazenda aos cidadãos. E como negar o aproveitamento integral a empresas que não funcionam mais significa “solapar o direito” do contribuinte, a trava não pode se aplicar nesses casos.
“Sequer é outorgado ao Estado pelo cidadão o poder de fazer o que quiser, agindo ao seu bel-prazer”, escreveu o juiz. “E nem se diga que o interesse público justifica, pura e simplesmente, a negação do crédito, pois o interesse público é o móvel do bom funcionamento social como um todo, não se confundindo a busca do bem comum com o interesse fiscal e com a supressão de direitos dos contribuintes.”
Com a decisão, foi extinta a exigibilidade de R$ 209,6 milhões em Imposto de Renda e Contribuição Social sobre Lucro Líquido da empresa VBC Energia, comprada pela Camargo Corrêa em 2009 e extinta. A compradora queria abater o prejuízo registrado pela comprada dos impostos devidos, mas a Receita entendeu que o abatimento deveria ser distribuído ao longo dos anos, e não feito de uma vez.
A tese da Receita, discutida em autuação fiscal já levada à Delegacia Regional de Julgamento, é que a Lei 9.065/1995, nos artigos 15 e 16, impõe o limite de 30% ao ano para abatimento de prejuízo do IRPJ e da CSLL. É a chamada “trava de 30%, declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal em 2013.
O Fisco se baseia em decisão de 2016 do Conselho Superior de Recursos Fiscais (CSRF), órgão máximo do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, que mudou o entendimento sobre a trava. A jurisprudência do Carf costumava ser a de que a trava de 30% era uma forma de prorrogar o aproveitamento do prejuízo fiscal, e não de impedi-lo. Portanto, empresas já fechadas não precisariam seguir esses limites.
Mas em 2016 o CSRF decidiu que, embora o Supremo não tenha entrado em detalhes sobre a declaração de constitucionalidade da trava de 30%, a declaração de constitucionalidade significa a aplicação ampla, inclusive para pessoas jurídicas que não estão mais em atividade.
Para o juiz Tiago de David, a discussão é polêmica, mas a Fazenda não tem razão. Em sua decisão de quarta, ele cita dois agravos de instrumento do Tribunal Regional Federal da 3ª Região antagônicos em relação à trava para empresas extintas, mas afirma que o próprio STF, na discussão sobre a constitucionalidade da trava, disse que sua aplicação comportava gradações.
“Se, na prática, a restrição se impõe de modo tal que acaba por esvaziar o direito do contribuinte, então há a frustração de posição jurídica atribuída pelo Direito”, afirma o juiz. Segundo ele, o que a Receita pretende, com o argumento, é transformar as orientações generalistas do Supremo em regras aplicáveis a casos concretos.
David também afirma que, embora o CSRF tenha mudado o entendimento do Carf sobre a matéria, a decisão se deu por voto de qualidade. Ou seja, o colegiado empatou durante o julgamento e o presidente da sessão foi quem desempatou por meio do voto de qualidade, “o que obviamente beneficia o Fisco, por a controvérsia sempre é dirimida por servidor indicado pelo Estado”. É que os presidentes de turmas julgadoras do Carf são sempre representantes da Fazenda.
Clique aqui para ler a decisão.
Mandado de Segurança 0019775-53.2016.403.6100
Pedro Canário é editor da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 18 de agosto de 2017
http://www.conjur.com.br/2017-ago-18/trava-30-nao-aplica-empresas-encerraram-atividades